Thursday, January 25, 2007

Da diferença entre Uff e Usp


A diferença é maior que situar a usp à direita...











Há um tempo atrás conheci uma menina paulista - eu morava no Rio - que fazia filosofia na fflch, era muito sabida e doida pela Marilena...

O que nos unia, na época, é que ela era doida por cerveja também. Um belo dia saimos pra beber e ela falava prosaicamente sobre vários assuntos até que começou a falar de Machado de Assis.

- então meu... o olhar, Capitu, ressaca e blábláblá.

Deixei que ela falasse um tempo, depois tive de interromper...

- escuta querida, todo este tempo que você passou lendo Machado de Assis, eu passei escutando Paralamas do Sucesso. De modo que se a prosa vai por aí, eu começo a ficar excluído. Que tal outro assunto?

Comecei a falar do Fluminense e ela pediu a conta.

Outro dia, influenciado, sem querer é verdade, por outra amiga, resolvi ler uns treco do Borges. Caí em depressão!

Agora vejo surgir os primeiros sinais de que a esperança retorna ao meu espírito. Ontem, apesar de jogar mal, o Fluzão despachou o Friburguense - morram de inveja Kachorrada!

Hoje, estava com um violão na mão e me perguntaram:
- o que você pretende fazer quando terminar o doutorado?

Lembrei da Rita lee... "eu só quero fazer parte de um backing vocal, e cantar o tempo todo tiubidulbaubau!". Mas... disse que gostaria de voltar pra Uff;

e lembrei de uma música, que não eu tocava tem tempos, que repetia ao final de cada refrão: Tchu ru ru tchururu ru ruru, tchu ru ru aaaaa; e descobri que, assim como houve um tempo em que preferia o Paralamas ao Machado, hoje ainda curto mais o Sui Generis do que o Borges (sei que os intelectuais vão querer me matar, né Lelê?).

Mas, enfim... aí vai a letra de una canción de Sui generis para lembrar de Alê, Lutito, Cris, Jack, Wilma, Tchelo, Jonhny, Ceci, Eriquita, Vivi, Lu, Nalu, Moniquinha, Tetê e... todo mundo (tenho que exercitar a memória pra escrever a parte de agradecimentos da tese, inda bem que a maioria é da USP e não é tão distante assim!).

Enfim... saudades são o primeiro sinal de que a esperança retorna...

"Canción Para Mi Muerte" de Sui Generis
"Hubo um tiempo que fue hermoso
Y fui libre de verdad
Guardaba todos mis sueños
En castillos de cristal

Poco a poco fuí creciendo
Y mis fábulas de amor
Se fueron desvaneciendo
Como pompas de jabón

Te encontrare una mañana
Dentro de mi habitación
Y prepararás la cama para dos
Tchu ru ru tchururu ru ruru, ru ru aaaaa

Es largar la carretera
Cuando uno mira atrás
Vas cruzando las fronteras
Sin darte cuenta quizás

Tómate del pasamanos
Porqué antes de llegar
Se aferraron mil ancianos
Pero se fueron igual

Te encontrare una mañana
Dentro de mi habitación
Y prepararás la cama para dos
Tchu ru ru tchururu ru ruru, ru ru aaaaa

Quisiera saber tu nombre
Tu lugar, tu dirección
Y si te han puesto teléfono
También tu numeración

Te suplico qué me avises
Si me vienes a buscar
No es porque te tenga miedo
Solo me quiero arreglar

Te encontrare una mañana
Dentro de mi habitación
Y prepararás la cama para dos
Tchu ru ru tchururu ru ruru, ru ru aaaaa (bis)"
...e a uff à esquerda!

Tuesday, January 23, 2007

Contra Lacan (só para registro)


Escrevi o texto anterior menos para me anunciar minha conversão ao lacanismo do que para desabafar. Desabafar um certo desespero, uma certa angústia, uma certa depressão inerente à fase (no sentido psicopatológico do termo) que estou passando; desabafar uma opinião acerca da verdade sobre nós mesmos e sua relação com as fantasias que criamos.

Entretanto percebi, muito mais pela perspicácia dos comentários que fizeram do que pelo conteúdo do texto, que ele tinha de certa forma a ver com as coisas que gostaria de pensar daqui pra frente. Então gostaria de aproveitar os comentários para registrar aqui algumas opiniões para que eu possa retornar a elas mais na frente.

Hoje em dia o tema da natureza humana, ou seja, da "verdade" sobre nós mesmos se define um pouco nos termos das relações que temos com os outros, ou com o Outro. No entanto este Outro, que aí escrevemos com maiúscula, não tem nada a ver com o outro do Lacan. Segundo Levinas tem mais a ver com o Deus de Descartes.

A idéia é complicada e detalhá-la seria maçante. Então resumamos o que interessa: o outro é uma idéia sem ideatum. Em termos mais psis, o outro é aquilo - ou aquele - que resiste ao nosso impulso destrutivo e que, portanto, não podemos determinar absolutamente. Diante de seu corpo - que está lá, contemplamos seus gestos - que não sabemos de onde vêm; diante de seu ser - que nos interessa, fascinamo-nos por seu desejo - que parece se interessar por nós.

Para nos tornamos o que somos, a saber, Eus, destruímos os objetos. Porém, alguns objetos de nossa experiência sobrevivem; e estabelecemos com eles uma relação mágica, amorosa, saímos de nossa realidade quando estamos na sua presença.

Aqueles que destruímos, fazemos deles objetos, dejetos, corpos mortos, inertes, sem sentido. Objetos lacanianos!

Aqueles que sobrevivem, fazemos deles almas, ânimas, belos, vivos; e pagamos o preço de nos desfazer, a nós mesmos, para dar-lhes vida. É neles que encontramos Deus. São eles também que consideramos humanos.

Agora retornemos aos comentários:

Tem razão Beatriz, é o negócio do desejo do desejo do outro que atrapalha (além da mardita cachaça, é claro!). É aí que os perdemos. Quando casamos, fazemos de uma namorada, uma esposa. Intermediamos a relação mágica que temos com nosso amor, pela instituição que pretende regular o desejo do outro. Em outras palavras, destruímos sua magia, sua vida, substituindo-as por regras. Regras através das quais, em última instância, nos damos o direito de considerá-lo nosso. Lógico que isso não se refere a todo casamento, no sentido real em que as pessoas se casam por aí. Mas àquilo que ele se torna quando se pretende institucional.

Neste sentido, Érika, me parece que felicidade e instituição são contraditórios. A instituição, o casamento no exemplo anterior, é a morte do outro. Do outro neste sentido mágico que nos faz feliz, que nos põe a fantasiar. Permanecemos na tristeza do Euzinho dando nomes aos nossos amores.

Não sei se este é o sentido da sua pergunta, mas não lhe parece isso? Não sei se é possível ficar absolutamente sozinho, mas concordo com o Tom (Jobim) que é impossível ser feliz sozinho. Pois, quando colocamos instituições entre nós e os outros, ficamos... sós. Perdemos o compromisso de nos enamorarmos a cada vez, posto que ganhamos a segurança de que o outro deve estar lá aonde a lei institucional determinou!

Já idéia de vazio no sentido lacaniano é mesmo impossível, mas não decorre-se disto, como pretende Lacan, que a experiência seja impossível. O fato de que nossa verdade coincide, de certo modo, com uma fratura, não que dizer que não somos nada ou que o outro não é nada. Acho que talvez possamos pensar, por mais que isso pareça estranho, que somos completos na nossa parcialidade.

Não sei se podemos considerar isso oriental, nem se podemos nos orientalizar. Se eles são melhores do que a gente, não implica necessariamente que possamos importar seus ensinamentos e aplicá-los ao nosso modo de ser. Não seria o contrário? Não é nossa a responsabilidade de criar respostas para os problemas que nós inventamos?

De qualquer forma, concordo com a idéia de que às vezes vivemos nossa incompletude com euforia e que, às vezes, damos a ela o nome de depressão. Mas o fato de que isso seja um nome não exclui o outro fato, presente e real, de que por muitos momentos estamos efetivamente tristes.

É isso, valeu o comentário de vocês, e espero que vocês nem leiam estas respostas, pois odeio aborrecer os outros. Mais interessante é fantasiá-los!

Prometo parar de filosofar sobre estas questões "profundas" e inúteis nos próximos textos. Até porque já sinto indícios do retorno da fase maníaca!

Friday, January 19, 2007

Poetas e Mulheres


Sei que é batido, mas também inevitável:

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

Isso é algo que concerne aos poetas, mas também ao gozo d'A Mulher. É que tanto na poesia, quanto no sexo, a verdade coincide com a fissura, com o buraco, com a cratera (pra usar um termo da moda). A verdade é o vazio, um vácuo, um buraco negro que suga nossos desejos fazendo-os explodir em múltiplas fantasias. Orgásmos múltiplos? Não, múltiplas fantasias. Somos feitos de saber, nós mesmos não temos nada a ver com o prazer no sentido real. Somos vazios, inventamos saberes para eleger alguns como verdade. Assim como sentimos o prazer que elegemos de nossos saberes, fingimos a dor para que ela possa também ser sentida. Somos poetas e também mulheres, mas vivemos no sentido inverso. Falamos e desejamos para esquecer da nossa verdade.

Caraca, vou acabar virando lacaniano!

Os poetas como as mulheres têm vários nomes. Qual é verdadeiro? Jocasta era mãe e esposa. Helena era de vários lugares. Alice era Jane. Daniela era Pauliana. E a Cuca era a Cuca. Porque é preciso dar nomes às putas? Porque não os damos aos bois?

Nomes que se grudam a uma essência inventada. É aí que as perdemos. Perdemos quando queremos saber além do que elas nos permitem inventar. Portanto, deixemo-las fingir para que possamos criar. Criação, fantasia, reverie, entstellung. Eis os nomes das nossas verdades!

Porque todo mundo anda deprê?

Saturday, January 13, 2007

Bento Prado


Morreu o Príncipe filósofo do Brasil... nosso pensamento ficou mais triste

Thursday, January 11, 2007

Beatriz Viterbo, ou o amor de Borges e o nosso...

Outro dia escrevi um post em que falava de uma história que me foi narrada - contada ou cantada - por uma musa, Beatriz. Como os amigos que visitam este blog preferem, em geral, me enviarem emails com seus comentários, ao invés de deixá-los por aqui mesmo, a pessoa que efetivamente comentou os textos até hoje foi... Beatriz: Beatriz Viterbo. Eis que graças a Beatriz e ao diabo da tese que eu tenho que escrever me deparei de novo com uma coisa que me perturba há muito tempo: EU... e minhas certezas passageiras.

Bom, alguns de vocês - aqueles que freqüentam o blog da Gi e as páginas de Borges - já devem saber. Para os demais, que fique claro: Beatriz Viterbo murió en una candente mañana de febrero de 1929, nas linhas do "Aleph", de Jorge Luis Borges.

Quanto à continuação do título, outros de vocês também devem saber: há algum tempo atrás andei escrevendo algumas abobrinhas sobre o amor. Tratava-se de algumas linhas sobre uma frase atribuída a Gabriel Garcia Marques: "Amo-te não pelo que tu és, mas pelo que me torno quando estou ao teu lado".

Para que embarquemos todos na mesma nau, recuemos por um instante: há uns dois anos atrás, recebi uma destas mensagens eletrônicas que têm umas imagenzinhas e umas frases bonitinhas. Esta me havia sido enviada por uma amiga - neste tempo já um pouco distante, mas que tinha sido bem próxima. Tinha umas dez imagenzinhas e frases de amor atribuídas a Garcia Marques - não me perguntem pela referência ou pela autenticidade da atribuição, isto importa pouco.

O que me intrigou foi a tal frase de número 7: Amo-te não pelo que tu és, mas pelo que me torno quando estou ao teu lado. Achei a frase absolutamente egoísta, narcisista e nada a ver com o amor do qual eu esperava ser o objeto para aquela amiga.

Como assim? Você me ama por você, não por mim?

Mas como vocês sabem, o amor tem destas coisas... quando não se pode obter dele a declaração que se deseja, torce-se a declaração e que se dane a intenção do sujeito. Imediatamente inventei de escrever um texto - que logo enviei para discutir com meus colegas de pesquisa da universidade (inconvenientes de não ter um blog). Lá eu torturava Freud, em Zur Einführung des Narzissmus, para que ele confessasse que minha amiga havia dito o que eu queria escutar. Concluí solenemente: O amor é um tornar-se. Amo-te não pelo seu ser, mas pelo meu devir, que é por ti! Achei tão maneiro que estou acabando de escrever uma parte da minha tese que trata exatamente disso. Eis aí talvez a única vantagem de um amor platônico e de se escrever uma tese: Pode-se enfiar em qualquer entrelinha o que a gente quiser pensar.

Tudo ia bem até aparecer Beatriz, mais precisamente, até Borges ver o Aleph. O que ele viu? TUDO! Bom vamos por partes, o que já é parte do problema...

Do que trata o Aleph? Em princípio de Beatriz Viterbo, um amor que se foi; e de um Eu - O autor - que deve permanecer para fazê-lo durar.

Quando Beatriz morreu - diz ele - noté que las carteleras de fierro de la Plaza Constitución habían renovado no sé qué aviso de cigarrillos rubios; el hecho me dolió, pues comprendí que el incesante y vasto universo ya se apartaba de ella y que ese cambio era el primero de una serie infinita. Para evitar o inevitável ele conclui: - Cambiará el universo pero yo no, pensé con melancólica vanidad; alguna vez, lo sé, mi vana devoción la había exasperado; muerta, yo podía consagrarme a su memoria, sin esperanza, pero también sin humillación.

Eis aí que a permanência do Eu é justamente a garantia da duração do amor, sem o inconveniente de ter que lidar com a humilhação da presença. Não era desta permanência que eu pretendia gozar enquanto estava falando de devir? Idiota!

No final do conto, o devir se faz imperativo: "Nuestra mente es porosa para el olvido; yo mismo estoy falseando y perdiendo, bajo la trágica erosión de los años, los rasgos de Beatriz".

Entre o amor e o devir, o Aleph! Mais exatamente: o ver - o acontecimento que mostra a mediocridade de toda memória, de toda a linguagem e mesmo da literatura. Ah... a literatura que deveria assugurar a imortalidade ao nosso Eu. Beatriz - a nossa, não a de Borges - escreveu outro dia que desejaria tornar-se um manuscrito de Aristóteles: "aí vou durar pra sempre, todo mundo vai me amar e eu não precisarei dizer que amo ninguém".

Já Borges remete, imediatamente, à mediocridade da literatura, as elaborações de Carlos Argentino: "Tan ineptas me parecieron esas ideas, tan pomposa y tan vasta su exposición, que las relacioné inmediatamente con la literatura".

É justamente quando vê o Aleph, que todos estes "recursos" ou "faculdades" do Eu revelam sua vacuidade: "Arribo, ahora, al inefable centro de mi relato, empieza aquí, mi desesperación de escritor. Todo lenguaje es un alfabeto de símbolos cuyo ejercicio presupone un pasado que los interlocutores comparten; ¿cómo transmitir a los otros el infinito Aleph, que mi temerosa memoria apenas abarca? (...) Lo que vieron mis ojos fue simultáneo: lo que transcribiré sucesivo, porque el lenguaje lo es".

É senhores... o amor pode desejar o que ele quiser, ser o que quiser, pois a memória e a linguagem torcem-se, distorcem-se e desfazem-se como o próprio desejo. Já ver, acontecer... isso não é para nós seres desejantes, lembrantes, falantes, narcísicos e egoístas.

Como no conto, depois da experiência, o Eu sempre retorna, não apenas para se vingar do outro, mas para constatar e verificar o que o devir desfez. Eis a tragédia de ser Eu: viver o acontecer como o que já não é!

Para terminar um toque de alento: a tese é defensável mesmo assim. Afinal, na academia tudo o que precisamos ser é lembrantes e falantes... e, de preferência, egoístas e narcisistas!

Saturday, December 30, 2006

A Regra 12 é clara!


A regra mais famosa do futebol no Brasil é a regra 3, a que trata do número de jogadores e das substituições.

Todo mundo sabe a história: até fins da década de 60, ela sentenciava que era proibida qualquer substituição durante o decorrer da partida. A partir da copa de 70, salvo engano - eu não era nascido! - esta regra foi alterada e passou a indicar exatamente o seu oposto: doravante era permitido substituir jogadores durante o jogo.

Como toda lei que prenuncia um direito, ela também trazia restrições, com o intuito de prevenir abusos. Tais restrições eram referentes ao número de substituições permitidas: 2,3, não importa, tratava-se de restringir a possibilidade de se abusar da regra três.

Ainda na década de 70, aprovou-se no Brasil a lei do divórcio. Pretendía-se, na época, reproduzir a revolução, feita anos antes no futebol, no seio das relações conjugais. Tantas o povo fez que o alerta para prevenir os abusos veio em forma de poesia do grande Vinícius, em samba de Toquinho:

"Tantas você fez que ela cansou
Porque você, rapaz
Abusou da regra três
Onde menos vale mais..."

Pode substituir, mas péra lá, né?

No futebol contemporâneo, bem como nas relações conjugais dos dias de hoje, o abuso se dá em relação à regra 12, a que trata das penalidades por faltas e desvios de conduta. Dizem que uma infração só deve ser punida se for intencional. Hoje em dia, os "especialistas" - Arnaldos e Godóys da vida - só entram em acordo em caso de cabeçada explícita - lembrem-se da final da copa do mundo.

De resto, como inventaram esse troço que chamam de inconsciente, parece que nenhuma ação pode mais ser considerada intencional, ao mesmo tempo que tentam responsabilizar o sujeito por tudo aquilo que ele faz inconscientemente! Eis o abuso... um abuso dos conceitos, que torna necessário restituir a verdade sobre a regra 12.

Como os ingleses não dão ponto sem nó, vejam o que diz a International Board, tábua em que se inscrevem as leis do futebol:

Law 12:

Fouls and misconduct are penalised as follows:

A direct free kick is awarded to the opposing team if a player commits any of the following six offences in a manner considered by the referee to be careless, reckless or using excessive force:

  • kicks or attempts to kick an opponent
  • trips or attempts to trip an opponent
  • jumps at an opponent
  • charges an opponent
  • strikes or attempts to strike an opponent
  • pushes an opponent

A direct free kick is also awarded to the opposing team if a playercommits any of the following four offences:

  • tackles an opponent to gain possession of the ball, making contact with the opponent before touching the ball
  • holds an opponent
  • spits at an opponent
  • handles the ball deliberately (except for the goalkeeper within his own penalty area)
A direct free kick is taken from where the offence occurred.

Percebem, em nenhum momento fala-se em intencionalidade. Apenas no que se refere a pôr a mão na bola, um conceito aparentemente análogo é evocado, diz-se: deliberadamente.

Ora amigos, eis aqui uma distinção importante: deliberação pressupõe uma escolha. Isso implica que o sujeito poderia não ter tocado na bola. Intenção não implica uma escolha. Ao contrário, o ato intencional é justamente aquele do qual o sujeito não pode se abster! Simplesmente a ação precipita-se do agente no instante em que ele é submetido a determinadas circunstâncias.

Assim, é possível, por exemplo, pressupor a intenção a qual se refere uma determinada sentença através do propósito ilocucionário de seu conteúdo proposicional. No entanto, isso não implica determinar se a sentença foi proferida deliberadamente ou não.

Aos juízes de plantão, bem como aos cônjuges traídos, fica o lembrete: será que pondo-se na situação do infrator, seria possível não cometer a falta?

Se a resposta for afirmativa, o canalha - ou a safada, sim porque mulheres também jogam bola, e muita bola nas costas! - agiu deliberadamente, e deve ser condenado (a).

Entretanto, se a resposta for negativa, é possível afirmar que a ação foi intencional, mas neste caso, deveria ser perdoada!

Um dia... de Nietzsche em Perdizes



Beatriz, minha mais nova musa inspiradora, me contou, outro dia, uma destas cenas que ela costuma observar em Perdizes, quando ela está passeando, assim, como se fosse um personagem de Manuel Carlos pelas "alamedas" do Leblon.

Estava ela passando em frente a uma confeitaria do Bairro e quando entrou para degustar seu indispensável Quiche de Alho Porró e Gruyère, observou um animado bate papo que acontecia na mesinha ao lado...

Ela me contou que se tratava de uma conversa entre um casal de personagens meio estranhos - destes que fazem parte das cenas atropologicamente interessantes que observamos em São Paulo: o homem beirava os 40 anos, portava um bigodão semelhante ao do Jamie 'Mythbuster' Hyneman e fazia o tipo filósofo; a menina tinha em torno de seus vinte poucos anos, uma bela face que expressava num mesmo golpe pureza e crueldade.

Ele apresentava no discurso sinais de uma loucura que se insinuava em meio aos seus já bem estranhos pensamentos e ela, embora jovem, parecia ser bem sabida em assuntos de psicologia.

Beatriz não sabe muito bem como o assunto começou, mas de onde ela pegou parecia que eles tratavam do tema da relação entre vivência e juízo, tema que parecia obcecar a jovem...

dizia o Filósofo: proferir juízos é a nossa crença mais antiga, o nosso mais costumeiro tomar-por-verdadeiro ou tomar-por-não-verdadeiro. Uma crença de que aqui realmente se 'conheceu' - em todos os juízos acredita-se ser verdadeiro o 'QUÊ'...

retrucava a menina: Então meu (aqui Beatriz percebeu que a menina era do tipo Uspiana admiradora de Marilena Chauí- uspianas admiradoras de Marilena sempre começam toda frase por 'então meu') é assim que eu penso... acho que aqui concordamos absolutamente... o princípio da vivência é sempre a possibilidade de comunicação, de interação pela linguagem. É que na linguagem podemos sempre compreender os objetos de nossa vivência. Lidar com o mundo é sempre contar para nós mesmos, como se contássemos a outro, o que estamos experimentando. Assim sabemos onde situar Borges quando o lemos, por relação a Garcia Marques, por exemplo. Há algum tempo pretendi situar Bukowski entre os dois, mas acho que não concordaria mais com isso... este último é um bosta!

Filósofo: Não é nada disso que eu falei!

Menina: Então meu, como assim? Viver não é atribuir predicados às nossas vivências?

Filósofo: O que são predicados? Atribuímos predicados quando não tomamos modificações em nós como tais, como vivências em nós, mas como um 'enquanto tal, em-si e por si' que é estranho a nós, que nós apenas 'constatamos', 'verificamos': quando nós não as postulamos como um acontecer, mas como um ser, como 'propriedade' - e a isso aditamos uma essência inventada, à qual elas se grudam, ou seja, nós colocamos o efeito como agente e o agente como ente...

Menina: ...então... efeito como agente e o agente como ente...acho que o sr. está ficando com febre...

Filósofo: Veja: se dizemos 'o sol brilha' - brilhar é um estado em nós; mas nós não o assumimos em nós e dizemos: 'algo brilhante, algo que brilha' como se houvesse um 'em-si, enquanto tal' e daí procuramos para isso um agente causador, o 'raio'. Postular o acontecer como um agir: e o efeito como ser, esse é o duplo erro, ou a interpretação de que nós nos tornamos culpados.

Menina: Então meu, me desculpa, mas é culpado aquele que não julga. Por isso é julgado e deve ser condenado! É culpado aquele que não sabe reconhecer em si e nos outros a responsabilidade pelas ações que cometem. Aquele que não pode pôr o mundo em sua devida ordem...

Filósofo: Assim não dá pra conversar. Você está sempre julgando de saída... não vê que fazemos as coisas sem pensar!

Menina: É às vezes faço coisas sem pensar...

Filósofo: Ás vezes?!?!?!?

Menina: É porque na maioria delas, sempre é preciso julgar, é preciso saber o que é bom e o que é mau, mesmo que seja pra optar pelo segundo...

Filósofo: Abra os olhos, o sol ainda brilha, ainda não se pôs, e você já quer saber sobre o bem, o mal...

Menina: Então meu, quer dizer que o sol brilha? Un-hum! Em que mundo o senhor vive? Parece ser colorido como a alvorada do sonho de um homem ridículo... não percebe para onde sempre vai o destino? Veja, o senhor parece ser bem inteligente, mas minha orientadora não o aprovaria sequer em um teste psicométrico. E ela tem me cobrado uma tese de doutorado, portanto não tenho mais tempo para ficar aqui viajando nestes exemplos. Foi muito interessante conhecê-lo, mas tenho compromissos mais sérios, talvez um dia...

Filósofo: um dia...

A menina foi embora, Beatriz se aproximou do homem e eles tiveram uma intensa conversa. Mas o conteúdo deste papo ela não quis me revelar. Quem sabe um dia...

Denúncia!


Denúncia de um repórter global demitido acerca da cobertura da TV Globo sobre as eleições...

"Faltando seis dias para o primeiro turno, o "petista" Humberto Costa foi indiciado pela PF. No caso dos vampiros. O fato foi parar em manchete no JN, e isso era normal. O anormal é que, no mesmo dia, esconderam o nome de Platão, ex-assessor do ministério na época de Serra/Barjas Negri. Os chefes sabiam da existência de Platão, pediram a produtores pra checar tudo sobre ele, mas preferiram não dar. Que jornalismo é esse, que poupa e defende Platão, mas detesta Freud! Deve haver uma explicação psicanalítica para jornalismo tão seletivo!"

Talvez a explicação seja platônica! É que existência de Platão não é tão importante quanto a essência das suas idéias...

Acho que os jornalistas da Globo foram os únicos desta espécie que não sofreram de overdose de Deleuze! Acusar Freud tudo bem, mas proteger e defender Platão? Em que ECA estes caras se formaram???

Os deuses e n l o u q u e c e r a m!!!!

Esses copos, de novo!


Outra noite, num estado de quase embriaguês, convidei uma amiga para beber uns chopps.
Ela delicadamente recusou meu convite, talvez por piedade do que poderia vir a me acontecer. Ao recusar, ela sugeriu que eu lêsse um desses autores de literatura etílica - acho que era Bukowski, não sei. Só me lembro que era um desses ...skis que eu nunca li.
Graças a esta breve conversa me lembrei de uma fase da minha vida em que eu pretendia me tornar um deles: "poetas etílicos".
Lá se vão quinze anos, do que restou apenas a tendência ao alcoolismo. Quanto aos escritos desta época, lembro-me daquele sobre os copos...

"Corpos e corpos e copos alcoólicos
Vendo bocas bebendo e olhos lunáticos que apontam... pra marte!
Mãos apressadas e partes de baixo
Que apontam pros olhos que apontam... pra marte!
Penas e penas e pernas compridas
Na exata medida das penas no chão que sustentam os pés*
Vento nos pelos e nós nas orelhas
Melodias pentelhas se intalam na entrada
Na hora marcada que as mãos se instalam na base dos copos
E bocas molhadas bebem seus corpos!"

Bons tempos quando a ressaca era relativa!

*obs: será esta a melhor medida para as pernas de um homem?

A doce vida paulistana!


O Paulistano é um masoquista! Claro que não me refiro exclusivamente ao sujeito que nasceu em São Paulo. Este aí é um tipo que teve que aprender a ser masoquista. Mas paulistano mesmo é o cara que nasceu em outro lugar e escolheu morar em São Paulo. Neste caso o masoquismo é de natureza, não aprendido. É a única explicação plausível para um indivíduo que escolheu morar aqui.

Ontem voltando pra casa, no meio daquele aguaceiro, parei em um bar para me abrigar. Naturalmente pedi uma cerva, digo uma brêja, e fiquei ali esperando a chuva passar. Logo fiquei curioso acerca do motivo pelo qual aquele bar, sempre cheio nesta hora, estava tão vazio. Ora, era impossível chegar em casa e, portanto, desanimador tentar. Onde estariam as pessoas então? Será que teriam ficado presas no seu local de trabalho? Se fosse isso, um paulistano teria achado bem agradável. No entanto, eles estavam fazendo uma coisa muito mais legal. Bastava olhar pela janela do bar e estavam todos lá. Estavam todos parados no engarrafamento!

O temporal para o paulistano é uma dádiva de São Pedro. Dia de temporal, ele é até capaz de sair mais cedo do trabalho, o que para um paulistano só pode acontecer em datas muito especiais. Eis que o dia de temporal é uma destas datas. É um dia que ele pode ficar gozando mais umas duas horas de seu santo engarrafamento.

A disposição de um paulistano para o trabalho já é por si só uma faceta de seu masoquismo. Fico imaginando que deveria ser legal ser playboy em São Paulo. Imagina se você tivesse muito dinheiro para pagar esta gente doida para trabalhar. Você encomendaria um avião para uma meia dúzia de paulistanos e na semana seguinte eles trariam o avião pronto e ainda dariam um jeito para estacioná-lo na sua garagem. A disposição deste povo para trabalhar é tão incrível que eles seriam capazes de, em pouco tempo, fabricar todo tipo de coisa que fosse capaz de faciltar a vida das pessoas.

Mas não a deles! Tudo que o paulistano faz, todo fruto de seu trabalho, tem o objetivo, cuidadosamente calculado, de dificultar sua vida. Basta ver o exemplo destas obras que fazem para facilitar o tráfego. O objetivo é justamente o oposto, é travar o tráfego mais ainda! A obra é um fim em si mesmo, quando fica pronta é preciso logo inventar outra maior para anular os eventuais benefícios da que terminou e, se possível, complicar mais um pouquinho.

Quando mudei para o bairro de Pinheiros a obra da vez era o "corredor" Rebouças. Descobri em pouco tempo que era mais rápido chegar à USP a pé do que de ônibus. Terminada a obra, imaginei: ufa, agora este trânsito melhora! Que nada, inventaram um buraco enorme no meio do largo da Batata. Assim puderam desviar o trânsito da avenida Faria Lima, para a rua Cunha Gago. O trânsito de cinco pistas seria desviado para uma rua em que passa somente um carro por vez. Quer gargalo melhor que esse?

Já tinha reparado esse masoquismo na relação do paulistano com o futebol. Alguém acha que algum corinthiano comerou o campeonato brasileiro do ano passado? De jeito nenhum! Eles comemoraram foi a classificação para a libertadores. Ora, Corinthians na libertadores, quer sofrimento maior que este?

Bem, mas podem me falar dos São paulinos, que afinal têm ganhado tudo. Mas vocês já conversaram com algum? O torcedor do São Paulo quando perde um campeonato diz: "não estávamos mesmo interessados, o São Paulo não tem concorretes neste campeonato, preferimos guardar nossas forças para o que realmente interessa". E quando ganha diz: "não teve graça, o São Paulo não tem concorretes neste campeonato e blá blá blá". O torcedor do São Paulo acha futebol a coisa mais chata do mundo e, no entanto, está sempre lotando o Morumbi. Só pode ser pra se chatear, né?

Imaginem uma rodada do campeonato carioca que terminasse assim: Flamengo 4 X 3 Bonsucesso; Fluminense 1 X 0 Olaria; Vasco 2 X 1 Madureira. Na segunda de manhã teria de ser ponto facultativo. Os torcedores destes times estariam todos embreagados com tamanhas goledas impostas a times de tanta tradição. Estariam a esta altura convictos de que torcem para o melhor time do mundo. O Botafogo? Bem teria sido Botafogo 1 X 4 Friburguense, mas ser botafoguense é outro tipo de masoquismo, até mais patológico, que deixamos para comentar outra vez.

Mas o mais impressionante nestas chuvas dos últimos dias é acompanhar o letreiro eletrônico que fica no alto do prédio do Unibanco próximo a ponte Eusébio Matoso: 100, 120, 130, 160 Km de... L E N T I D Ã O! Todo dia tem recorde, que é orgulhosamente anunciado. Vai gostar deste troço lá no raio que o parta (ops, cuidado com as idéias!). Melhor que isso só o placar eletrônico do Parque Antártica no último jogo que o Palmeiras fez lá na temporada. O time tomava um chocolate de 4 do Inter e o placar dizia: "Apóie o seu time!" Deve ser porque o time estava fazendo o seu papel. Afinal de contas, em São Paulo, é disso que o povo gosta!