Saturday, December 30, 2006

A Regra 12 é clara!


A regra mais famosa do futebol no Brasil é a regra 3, a que trata do número de jogadores e das substituições.

Todo mundo sabe a história: até fins da década de 60, ela sentenciava que era proibida qualquer substituição durante o decorrer da partida. A partir da copa de 70, salvo engano - eu não era nascido! - esta regra foi alterada e passou a indicar exatamente o seu oposto: doravante era permitido substituir jogadores durante o jogo.

Como toda lei que prenuncia um direito, ela também trazia restrições, com o intuito de prevenir abusos. Tais restrições eram referentes ao número de substituições permitidas: 2,3, não importa, tratava-se de restringir a possibilidade de se abusar da regra três.

Ainda na década de 70, aprovou-se no Brasil a lei do divórcio. Pretendía-se, na época, reproduzir a revolução, feita anos antes no futebol, no seio das relações conjugais. Tantas o povo fez que o alerta para prevenir os abusos veio em forma de poesia do grande Vinícius, em samba de Toquinho:

"Tantas você fez que ela cansou
Porque você, rapaz
Abusou da regra três
Onde menos vale mais..."

Pode substituir, mas péra lá, né?

No futebol contemporâneo, bem como nas relações conjugais dos dias de hoje, o abuso se dá em relação à regra 12, a que trata das penalidades por faltas e desvios de conduta. Dizem que uma infração só deve ser punida se for intencional. Hoje em dia, os "especialistas" - Arnaldos e Godóys da vida - só entram em acordo em caso de cabeçada explícita - lembrem-se da final da copa do mundo.

De resto, como inventaram esse troço que chamam de inconsciente, parece que nenhuma ação pode mais ser considerada intencional, ao mesmo tempo que tentam responsabilizar o sujeito por tudo aquilo que ele faz inconscientemente! Eis o abuso... um abuso dos conceitos, que torna necessário restituir a verdade sobre a regra 12.

Como os ingleses não dão ponto sem nó, vejam o que diz a International Board, tábua em que se inscrevem as leis do futebol:

Law 12:

Fouls and misconduct are penalised as follows:

A direct free kick is awarded to the opposing team if a player commits any of the following six offences in a manner considered by the referee to be careless, reckless or using excessive force:

  • kicks or attempts to kick an opponent
  • trips or attempts to trip an opponent
  • jumps at an opponent
  • charges an opponent
  • strikes or attempts to strike an opponent
  • pushes an opponent

A direct free kick is also awarded to the opposing team if a playercommits any of the following four offences:

  • tackles an opponent to gain possession of the ball, making contact with the opponent before touching the ball
  • holds an opponent
  • spits at an opponent
  • handles the ball deliberately (except for the goalkeeper within his own penalty area)
A direct free kick is taken from where the offence occurred.

Percebem, em nenhum momento fala-se em intencionalidade. Apenas no que se refere a pôr a mão na bola, um conceito aparentemente análogo é evocado, diz-se: deliberadamente.

Ora amigos, eis aqui uma distinção importante: deliberação pressupõe uma escolha. Isso implica que o sujeito poderia não ter tocado na bola. Intenção não implica uma escolha. Ao contrário, o ato intencional é justamente aquele do qual o sujeito não pode se abster! Simplesmente a ação precipita-se do agente no instante em que ele é submetido a determinadas circunstâncias.

Assim, é possível, por exemplo, pressupor a intenção a qual se refere uma determinada sentença através do propósito ilocucionário de seu conteúdo proposicional. No entanto, isso não implica determinar se a sentença foi proferida deliberadamente ou não.

Aos juízes de plantão, bem como aos cônjuges traídos, fica o lembrete: será que pondo-se na situação do infrator, seria possível não cometer a falta?

Se a resposta for afirmativa, o canalha - ou a safada, sim porque mulheres também jogam bola, e muita bola nas costas! - agiu deliberadamente, e deve ser condenado (a).

Entretanto, se a resposta for negativa, é possível afirmar que a ação foi intencional, mas neste caso, deveria ser perdoada!

Um dia... de Nietzsche em Perdizes



Beatriz, minha mais nova musa inspiradora, me contou, outro dia, uma destas cenas que ela costuma observar em Perdizes, quando ela está passeando, assim, como se fosse um personagem de Manuel Carlos pelas "alamedas" do Leblon.

Estava ela passando em frente a uma confeitaria do Bairro e quando entrou para degustar seu indispensável Quiche de Alho Porró e Gruyère, observou um animado bate papo que acontecia na mesinha ao lado...

Ela me contou que se tratava de uma conversa entre um casal de personagens meio estranhos - destes que fazem parte das cenas atropologicamente interessantes que observamos em São Paulo: o homem beirava os 40 anos, portava um bigodão semelhante ao do Jamie 'Mythbuster' Hyneman e fazia o tipo filósofo; a menina tinha em torno de seus vinte poucos anos, uma bela face que expressava num mesmo golpe pureza e crueldade.

Ele apresentava no discurso sinais de uma loucura que se insinuava em meio aos seus já bem estranhos pensamentos e ela, embora jovem, parecia ser bem sabida em assuntos de psicologia.

Beatriz não sabe muito bem como o assunto começou, mas de onde ela pegou parecia que eles tratavam do tema da relação entre vivência e juízo, tema que parecia obcecar a jovem...

dizia o Filósofo: proferir juízos é a nossa crença mais antiga, o nosso mais costumeiro tomar-por-verdadeiro ou tomar-por-não-verdadeiro. Uma crença de que aqui realmente se 'conheceu' - em todos os juízos acredita-se ser verdadeiro o 'QUÊ'...

retrucava a menina: Então meu (aqui Beatriz percebeu que a menina era do tipo Uspiana admiradora de Marilena Chauí- uspianas admiradoras de Marilena sempre começam toda frase por 'então meu') é assim que eu penso... acho que aqui concordamos absolutamente... o princípio da vivência é sempre a possibilidade de comunicação, de interação pela linguagem. É que na linguagem podemos sempre compreender os objetos de nossa vivência. Lidar com o mundo é sempre contar para nós mesmos, como se contássemos a outro, o que estamos experimentando. Assim sabemos onde situar Borges quando o lemos, por relação a Garcia Marques, por exemplo. Há algum tempo pretendi situar Bukowski entre os dois, mas acho que não concordaria mais com isso... este último é um bosta!

Filósofo: Não é nada disso que eu falei!

Menina: Então meu, como assim? Viver não é atribuir predicados às nossas vivências?

Filósofo: O que são predicados? Atribuímos predicados quando não tomamos modificações em nós como tais, como vivências em nós, mas como um 'enquanto tal, em-si e por si' que é estranho a nós, que nós apenas 'constatamos', 'verificamos': quando nós não as postulamos como um acontecer, mas como um ser, como 'propriedade' - e a isso aditamos uma essência inventada, à qual elas se grudam, ou seja, nós colocamos o efeito como agente e o agente como ente...

Menina: ...então... efeito como agente e o agente como ente...acho que o sr. está ficando com febre...

Filósofo: Veja: se dizemos 'o sol brilha' - brilhar é um estado em nós; mas nós não o assumimos em nós e dizemos: 'algo brilhante, algo que brilha' como se houvesse um 'em-si, enquanto tal' e daí procuramos para isso um agente causador, o 'raio'. Postular o acontecer como um agir: e o efeito como ser, esse é o duplo erro, ou a interpretação de que nós nos tornamos culpados.

Menina: Então meu, me desculpa, mas é culpado aquele que não julga. Por isso é julgado e deve ser condenado! É culpado aquele que não sabe reconhecer em si e nos outros a responsabilidade pelas ações que cometem. Aquele que não pode pôr o mundo em sua devida ordem...

Filósofo: Assim não dá pra conversar. Você está sempre julgando de saída... não vê que fazemos as coisas sem pensar!

Menina: É às vezes faço coisas sem pensar...

Filósofo: Ás vezes?!?!?!?

Menina: É porque na maioria delas, sempre é preciso julgar, é preciso saber o que é bom e o que é mau, mesmo que seja pra optar pelo segundo...

Filósofo: Abra os olhos, o sol ainda brilha, ainda não se pôs, e você já quer saber sobre o bem, o mal...

Menina: Então meu, quer dizer que o sol brilha? Un-hum! Em que mundo o senhor vive? Parece ser colorido como a alvorada do sonho de um homem ridículo... não percebe para onde sempre vai o destino? Veja, o senhor parece ser bem inteligente, mas minha orientadora não o aprovaria sequer em um teste psicométrico. E ela tem me cobrado uma tese de doutorado, portanto não tenho mais tempo para ficar aqui viajando nestes exemplos. Foi muito interessante conhecê-lo, mas tenho compromissos mais sérios, talvez um dia...

Filósofo: um dia...

A menina foi embora, Beatriz se aproximou do homem e eles tiveram uma intensa conversa. Mas o conteúdo deste papo ela não quis me revelar. Quem sabe um dia...

Denúncia!


Denúncia de um repórter global demitido acerca da cobertura da TV Globo sobre as eleições...

"Faltando seis dias para o primeiro turno, o "petista" Humberto Costa foi indiciado pela PF. No caso dos vampiros. O fato foi parar em manchete no JN, e isso era normal. O anormal é que, no mesmo dia, esconderam o nome de Platão, ex-assessor do ministério na época de Serra/Barjas Negri. Os chefes sabiam da existência de Platão, pediram a produtores pra checar tudo sobre ele, mas preferiram não dar. Que jornalismo é esse, que poupa e defende Platão, mas detesta Freud! Deve haver uma explicação psicanalítica para jornalismo tão seletivo!"

Talvez a explicação seja platônica! É que existência de Platão não é tão importante quanto a essência das suas idéias...

Acho que os jornalistas da Globo foram os únicos desta espécie que não sofreram de overdose de Deleuze! Acusar Freud tudo bem, mas proteger e defender Platão? Em que ECA estes caras se formaram???

Os deuses e n l o u q u e c e r a m!!!!

Esses copos, de novo!


Outra noite, num estado de quase embriaguês, convidei uma amiga para beber uns chopps.
Ela delicadamente recusou meu convite, talvez por piedade do que poderia vir a me acontecer. Ao recusar, ela sugeriu que eu lêsse um desses autores de literatura etílica - acho que era Bukowski, não sei. Só me lembro que era um desses ...skis que eu nunca li.
Graças a esta breve conversa me lembrei de uma fase da minha vida em que eu pretendia me tornar um deles: "poetas etílicos".
Lá se vão quinze anos, do que restou apenas a tendência ao alcoolismo. Quanto aos escritos desta época, lembro-me daquele sobre os copos...

"Corpos e corpos e copos alcoólicos
Vendo bocas bebendo e olhos lunáticos que apontam... pra marte!
Mãos apressadas e partes de baixo
Que apontam pros olhos que apontam... pra marte!
Penas e penas e pernas compridas
Na exata medida das penas no chão que sustentam os pés*
Vento nos pelos e nós nas orelhas
Melodias pentelhas se intalam na entrada
Na hora marcada que as mãos se instalam na base dos copos
E bocas molhadas bebem seus corpos!"

Bons tempos quando a ressaca era relativa!

*obs: será esta a melhor medida para as pernas de um homem?

A doce vida paulistana!


O Paulistano é um masoquista! Claro que não me refiro exclusivamente ao sujeito que nasceu em São Paulo. Este aí é um tipo que teve que aprender a ser masoquista. Mas paulistano mesmo é o cara que nasceu em outro lugar e escolheu morar em São Paulo. Neste caso o masoquismo é de natureza, não aprendido. É a única explicação plausível para um indivíduo que escolheu morar aqui.

Ontem voltando pra casa, no meio daquele aguaceiro, parei em um bar para me abrigar. Naturalmente pedi uma cerva, digo uma brêja, e fiquei ali esperando a chuva passar. Logo fiquei curioso acerca do motivo pelo qual aquele bar, sempre cheio nesta hora, estava tão vazio. Ora, era impossível chegar em casa e, portanto, desanimador tentar. Onde estariam as pessoas então? Será que teriam ficado presas no seu local de trabalho? Se fosse isso, um paulistano teria achado bem agradável. No entanto, eles estavam fazendo uma coisa muito mais legal. Bastava olhar pela janela do bar e estavam todos lá. Estavam todos parados no engarrafamento!

O temporal para o paulistano é uma dádiva de São Pedro. Dia de temporal, ele é até capaz de sair mais cedo do trabalho, o que para um paulistano só pode acontecer em datas muito especiais. Eis que o dia de temporal é uma destas datas. É um dia que ele pode ficar gozando mais umas duas horas de seu santo engarrafamento.

A disposição de um paulistano para o trabalho já é por si só uma faceta de seu masoquismo. Fico imaginando que deveria ser legal ser playboy em São Paulo. Imagina se você tivesse muito dinheiro para pagar esta gente doida para trabalhar. Você encomendaria um avião para uma meia dúzia de paulistanos e na semana seguinte eles trariam o avião pronto e ainda dariam um jeito para estacioná-lo na sua garagem. A disposição deste povo para trabalhar é tão incrível que eles seriam capazes de, em pouco tempo, fabricar todo tipo de coisa que fosse capaz de faciltar a vida das pessoas.

Mas não a deles! Tudo que o paulistano faz, todo fruto de seu trabalho, tem o objetivo, cuidadosamente calculado, de dificultar sua vida. Basta ver o exemplo destas obras que fazem para facilitar o tráfego. O objetivo é justamente o oposto, é travar o tráfego mais ainda! A obra é um fim em si mesmo, quando fica pronta é preciso logo inventar outra maior para anular os eventuais benefícios da que terminou e, se possível, complicar mais um pouquinho.

Quando mudei para o bairro de Pinheiros a obra da vez era o "corredor" Rebouças. Descobri em pouco tempo que era mais rápido chegar à USP a pé do que de ônibus. Terminada a obra, imaginei: ufa, agora este trânsito melhora! Que nada, inventaram um buraco enorme no meio do largo da Batata. Assim puderam desviar o trânsito da avenida Faria Lima, para a rua Cunha Gago. O trânsito de cinco pistas seria desviado para uma rua em que passa somente um carro por vez. Quer gargalo melhor que esse?

Já tinha reparado esse masoquismo na relação do paulistano com o futebol. Alguém acha que algum corinthiano comerou o campeonato brasileiro do ano passado? De jeito nenhum! Eles comemoraram foi a classificação para a libertadores. Ora, Corinthians na libertadores, quer sofrimento maior que este?

Bem, mas podem me falar dos São paulinos, que afinal têm ganhado tudo. Mas vocês já conversaram com algum? O torcedor do São Paulo quando perde um campeonato diz: "não estávamos mesmo interessados, o São Paulo não tem concorretes neste campeonato, preferimos guardar nossas forças para o que realmente interessa". E quando ganha diz: "não teve graça, o São Paulo não tem concorretes neste campeonato e blá blá blá". O torcedor do São Paulo acha futebol a coisa mais chata do mundo e, no entanto, está sempre lotando o Morumbi. Só pode ser pra se chatear, né?

Imaginem uma rodada do campeonato carioca que terminasse assim: Flamengo 4 X 3 Bonsucesso; Fluminense 1 X 0 Olaria; Vasco 2 X 1 Madureira. Na segunda de manhã teria de ser ponto facultativo. Os torcedores destes times estariam todos embreagados com tamanhas goledas impostas a times de tanta tradição. Estariam a esta altura convictos de que torcem para o melhor time do mundo. O Botafogo? Bem teria sido Botafogo 1 X 4 Friburguense, mas ser botafoguense é outro tipo de masoquismo, até mais patológico, que deixamos para comentar outra vez.

Mas o mais impressionante nestas chuvas dos últimos dias é acompanhar o letreiro eletrônico que fica no alto do prédio do Unibanco próximo a ponte Eusébio Matoso: 100, 120, 130, 160 Km de... L E N T I D Ã O! Todo dia tem recorde, que é orgulhosamente anunciado. Vai gostar deste troço lá no raio que o parta (ops, cuidado com as idéias!). Melhor que isso só o placar eletrônico do Parque Antártica no último jogo que o Palmeiras fez lá na temporada. O time tomava um chocolate de 4 do Inter e o placar dizia: "Apóie o seu time!" Deve ser porque o time estava fazendo o seu papel. Afinal de contas, em São Paulo, é disso que o povo gosta!